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    UOL | O que está por trás do aumento dos assassinatos em SP?

    5 de setembro de 2020 às 12:43

    Por Alex Tajra e Luís Adorno (leia o texto original publicado pelo UOL)

    No dia 24 de março, um jovem de 21 anos matou a tiros seu padrasto em São Roque, interior de São Paulo. O rapaz teria cometido o homicídio ao presenciar sua mãe sendo agredida pelo marido dela, o pedreiro Elias Venancio da Silva Filho, 44. Ele chegou a ser socorrido, mas morreu por conta dos disparos que atingiram seu peito e sua mão.

    Casos como este, ou seja, homicídios dolosos (com a intenção de matar) que envolvem brigas entre conhecidos, puxaram o aumento de vítimas de assassinatos registradas no estado de São Paulo este ano. Houve crescimento de 5,2% no total de vítimas de homicídio doloso entre janeiro e julho deste ano quando comparado ao mesmo período do ano passado.

    Quando a comparação é feita apenas com o mês de julho de 2020 e do ano passado, houve aumento de 15,5% no número de vítimas de homicídios dolosos em São Paulo.

    Segundo o governo de São Paulo, o aumento nos homicídios se deve “principalmente a brigas interpessoais entre conhecidos”.

    Especialistas entrevistados pelo UOL apontam que essa alta nos assassinatos está relacionada ao aumento de conflitos violentos por conta da pandemia no novo coronavírus e às dinâmicas do crime organizado. O maior acesso às armas de fogo também é um dos motivos a ser levado em conta.

    As hipóteses levantadas são:

    • A pandemia impulsionou conflitos violentos durante a pandemia, em especial os domésticos;
    • Com as lideranças do PCC (Primeiro Comando da Capital) isoladas em presídio federal, e com esse isolamento agravado pela pandemia, a maior facção brasileira teria perdido o controle sobre os “tribunais do crime”, gerando um aumento de mortes relacionadas ao crime organizado;
    • Com decretos e portarias flexibilizando o acesso às armas de fogo, há maior número delas em circulação e, com isso, maior número de homicídios;

    PCC não perdeu força

    “Questões habituais, como o tráfico de drogas, não deixaram de de operar. Pode ser que, com a pandemia, os conflitos familiares, brigas de vizinhos, de condomínio, tenham aumentado”, diz Lincoln Gakiya, promotor de Justiça do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), que se mostra cético com a perda de comando do PCC no estado.

    “Com o pagamento do auxílio emergencial, o faturamento nas ‘biqueiras’ [pontos de venda de drogas] do PCC aumentou, pois muitos usuários estão utilizando esse dinheiro para compra de drogas.”

    Dinâmicas do crime

    Para o professor e pesquisador da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Rafael Alcadipani, não há como deixar de lado a hipótese de que as dinâmicas de crime organizado tenham influenciado no aumento de homicídios.

    De acordo com ele, há a possibilidade de que haja membros de facções criminosas entre as vítimas de homicídios.

    “A maioria dos homicídios estão acontecendo em via pública, o que denota a possibilidade de que estejam relacionadas às dinâmicas do crime organizado. Tem a questão do isolamento dos líderes do PCC em Brasília, fala-se de algumas pessoas nas ruas querendo assumir posições de proeminência que podem gerar o aumento dos homicídios”, diz Alcadipani à reportagem.

    Segundo a SSP (Secretaria de Segurança Pública), em julho, 52,9% dos homicídios ocorreram nas ruas e 26%, nas residências.

    Para Alcadipani, o isolamento de lideranças do PCC tem de ser levado em consideração pois a comunicação precária com os faccionados que atuam nas ruas pode ter levado a um descontrole no uso da violência.

    Violência doméstica em alta

    Dois dados ajudam a traçar hipóteses sobre o aumento da violência doméstica em meio a pandemia. Em julho de 2019, 4,8% dos casos de homicídios tiveram como possível motivação o conflito entre casais. No mesmo mês deste ano, esta porcentagem subiu para 8,3%.

    Também cresceu a proporção de mortes dentro das residências, de 15,5% em julho passado para 26% dos homicídios no mesmo período deste ano.

    Em abril, houve um aumento de denúncias de violência doméstica pelo número 180 de quase 40% em relação ao mesmo mês do ano passado, segundo dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. O número de estupros também cresceu.

    Armas de fogo

    Outra hipótese para o aumento de assassinatos está relacionada ao maior acesso às armas de fogo. A pauta foi bandeira de campanha do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e foi umas das prioritária do governo em seu primeiro ano.

    Em 2019, houve recorde nos registros concedidos para armas de fogo. Foram 70,8 mil registros concedidos, maior número ao menos desde 1997, conforme reportado pela Folha de S.Paulo.

    A esta informação acrescenta-se o dado de que o estado de São Paulo, em 2018, concentrava 21,3% das armas regularizadas à época.

    Para Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, “é possível que exista” a correlação entre o aumento do número de armas disponíveis e o aumento de homicídios, mas que essa ligação nem sempre é automática.

    “O que a gente tem de consenso entre os que estudam o assunto é que mais armas em circulação resultam em mais crimes contra a vida.” Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz

    “Crimes envolvendo desconhecidos provavelmente têm mais a ver com uma maior quantidade de armas em circulação. São aqueles crimes de cinco minutos, em que a pessoa perde a cabeça e mata mais pela emoção. Homicídios ligados ao crime têm uma certa premeditação, uma certa punição a alguém que descumpriu uma regra”, diz Bruno Paes Manso, pesquisador do NEV (Núcleo de Estudos da Violência) da USP (Universidade de São Paulo).

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