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    Ponte | Operação da PM na Baixada Santista não poupou nem crianças e adolescentes, denuncia relatório

    26 de fevereiro de 2024 às 02:31

    Governo deveria pedir desculpas por mortes, afirma documento assinado por entidades de direitos humanos, ativistas e políticos, entregue hoje ao Ministério Público

    Reportagem publicada pela Ponte (clique para acessar o texto original)

    A operação da Polícia Militar do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), na Baixada Santista vitimou pelo menos dois adolescentes e teve uma criança entre os alvos de abordagem truculenta. É o que denuncia um relatório produzido por entidades de direitos humanos, ativistas e políticos, entregue nesta segunda-feira (26/2) ao procurador-geral de justiça paulista, Mário Sarrubbo, na sede do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), no centro da capital paulista.

    O relatório foi produzido a partir de uma visita nas áreas alvo das ação da PM, em 11 de fevereiro, na qual os autores colheram depoimentos sobre execuções sumárias, invasões de domicílio e violência nas interações dos policiais com a população.

    Leia o relatório na integraBaixar

    O documento foi entregue ao procurador-geral em uma reunião fechada. Sarrubbo, que deve deixar o cargo para assumir a Secretaria Nacional de Segurança Pública a convite do ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, anunciou na última semana a criação de um grupo especial de promotores para atuar diretamente nos casos da operação.

    Além de detalhar os relatos dos moradores e familiares de vítimas, as organizações propuseram recomendações ao MPSP para o controle das ações policiais na Baixada. As entidades pedem rigor nas perícias, a solicitação de imagens de câmeras corporais dos policiais, a garantia de proteção aos afetados e um pedido de desculpas público do Estado pelas mortes.

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    O relatório é assinado pela Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo, Centro de Direitos Humanos e Educação Popular (CDHEP), Comissão Arns, Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP, Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana (Condepe), Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Instituto Sou da Paz, Instituto Vladimir Herzog, Rede de Proteção e Resistência ao Genocídio da Juventude Preta, Pobre e Periférica, pelos mandatos dos deputados estaduais Mônica Seixas (Psol) e Eduardo Suplicy (PT)) e dos vereadores Débora Alves Camilo de Santos (PSol) e Tiago Peretto (PL), de São Vicente.

    As Operações Escudo são ações organizada de vingança instituída pelo governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) para intensificar o policiamento em determinadas regiões após a morte de policiais. Criticadas por moradores de bairros pobres e por ativistas de direitos humanos pelas práticas de execuções, torturas e ameaças, as operações já foram denunciadas duas vezes na Organização das Nações Unidas (ONU) e também na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

    A visita em 11 de fevereiro encontro uma realidade áspera entre as vítimas da operação. Na ocasião, a presença policial na Baixada já havia sido intensificada após a morte do sargento Samuel Wesley Cosmo, 35 anos, membro das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota), uma força especial da PM de São Paulo. Ao menos 20 pessoas tinham sido mortas naquela data. Atualmente, o número de mortos da operação chegou a 33 em 24 dias, superando o registrado em uma operação semelhante ocorrida em 2023.

    A velocidade acelerada das mortes e o volume de denúncias de violação demonstram um cenário preocupante, disse à Ponte Dimitri Sales, presidente do Condepe. 

    “A Operação Escudo desta vez é muito mais violenta. A impressão é que os policiais não estão sob nenhum tipo de controle. Se na primeira operação nós tivemos essa impressão, nesta temos a certeza de que os policiais estão agindo sem nenhum tipo de controle. O medo é um instrumento de controle social dos policiais para a sociedade, mas a violência é mais generalizada. Quando você tem adolescentes sendo alvo da violência policial, quando você tem uma atuação que se volta depois dos fatos para desfazer o local das provas, demonstra que a operação está cada vez mais calcada tanto na violência, mas sobretudo na ilegalidade”, afirma. 

    As organizações percorreram regiões pobres e alvos da operação em São Vicente e Santos. Um dos relatos que ouviram foi do pai de um dos adolescentes mortos por uma equipe da Força Tática em Itanhaém. O caso ocorreu em 7 de fevereiro, quando a dupla que morava em São Vicente foi passear na cidade vizinha. 

    O pai contou que o filho e um colega estavam em um beco onde ocorria tráfico de drogas, mas não estavam armados. Testemunhas que viram a ação confirmaram a versão aos membros da comitiva. O documento afirma ainda que o médico legista teria afirmado que não houve troca de tiros, indicando que um dos adolescentes foi morto à queima-roupa com seis disparos. 

    Já em São Vicente, a mãe de uma criança de 10 anos teria relatado que o filho foi alvo de uma abordagem truculenta. O caso ocorreu no Parque Bitaru, mesma região onde um funcionário da prefeitura, desarmado, foi baleado duas vezes por um policial.

    A PM negou a relação da situação com a operação na Baixada, mas as organizações incluíram o caso no relatório. O texto revela ainda que o pai do funcionário, que estava com o filho no momento em que ele foi ferido, só conseguiu prestar depoimento à polícia com o auxílio da comitiva. Antes disso, foi barrado. Em uma das ocasiões, uma funcionária do 1º DP de São Vicente teria dito “que o BO já estava registrado” e que “não poderia acrescentar mais nada”. 

    Essas situações não são isoladas, afirma a psicóloga Marisa Feffermann, articuladora da Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio. Ela teme a banalização desse tipo de ação violadora.

    “Todo mundo tem medo de falar qualquer coisa. Eles pegam crianças, idosos. Eles ameaçam as pessoas. Esse medo generalizado faz com que as pessoas fiquem impotentes. A nossa preocupação enquanto Rede é que essa política possa ser generalizada, quer dizer, você passa a banalizar essa situação e o policial fica atuando nessa perspectiva”, afirma. 

    Marisa também fala da importância do trabalho de perícia. Esse é um dos pontos levantados pelo relatório. As organizações pedem que o MPSP monitore o andamento e as conclusões das perícias para garantir independência e qualidade técnica dos trabalhos. 

    “Nós não temos perspectiva nenhuma de parar e as comunidades estão todas morrendo de medo. A grande questão que hoje se trouxe é a perícia. Em nenhum dos locais em que as pessoas foram mortas foi garantida qualquer tipo de averiguação. Todas as provas foram destruídas”, afirma.

    O relatório fala em oito execuções sumárias ocorridas entre os dias 7 e 9 de fevereiro em Santos e São Vicente. Alguns dos casos foram relatados pela Ponte, como os das mortes do catador de latinhas José Marques Nunes da Silva, 45 anos, dos amigos de infância Leonel Santos, 36, e Jefferson Miranda, 37, e de Hildebrando Simão Neto, 24, que tinha deficiência visual.

    No relatório, consta que as organizações tiveram acesso a laudos que comprovam que Hildebrando tinha apenas 20% da visão em um dos olhos, justificativa trazida pela família para contestar a versão policial de confronto.

    Os membros da missão também conversaram com um motorista de aplicativo que relatou um caso de emboscada em Santos. No dia 5, ele levou um passageiro que teria tentado entrar em contato várias vezes com uma mulher, mas, sem sucesso, retornou ao veículo. No caminho de volta, a dupla foi abordada por PMs das Rodas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota). O motorista contou que os policiais pediram para ele sair, enquanto o passageiro permaneceu no veículo. Um dos policiais contornou o carro e atirou. A testemunha relatou ter sido ameaçada pelos agentes caso não mantivesse a versão apresentada por eles de troca de tiros.

    A visita da própria comitiva foi marcada por tensão. Na entrada na favela de Sambaiatuba, em São Vicente,, policiais da ROTA armados com fuzis questionaram se autoridades tinham sido avisadas da visita. Um dos policiais teria alertado para que o grupo tomasse cuidado com uma possível troca de tiros. 

    Depois, o mesmo agente teria questionado a um dos membros da comitiva se ele tinha passagens. Foi necessária a intervenção do Ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo, Claudio Silva, e da Ouvidora Nacional de Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Luzia Cantal, para que a viatura seguisse seu patrulhamento e a comitiva seu destino no bairro

    Medo da população 

    Há relatos também de violências físicas e perseguição. Um jovem, primo de uma vítima da operação, contou ter sido torturado por policiais do Batalhão de Ações Especiais de Polícia (Baep). Segundo contou, os agentes entraram na casa onde ele vive, colocaram uma arma no seu peito e um saco em sua cabeça, perguntando se ele conhecia os “bandidos” que foram executados na região. 

    Em outro caso, um homem contou que policiais civis foram até sua casa com uma foto 3×4 procurando por ele. Egresso do sistema prisional, ele não estava em casa no momento da abordagem e ficou dias longe, com medo de uma possível emboscada.

    “Isso nos chama muito atenção. A ideia com essa conversa com o procurador-geral era apontar uma série de consequências da operação que tem levado inclusive ao terrorismo naquelas pessoas. Elas estão aterrorizadas”, disse à Ponte o ouvidor das Polícias, Cláudio SIlva. 

    A diretora-executiva do Fórum Brasleiro da Segurança Pública (FBSP), Samira Bueno, diz que, para além da pressão no MPSP, é preciso avançar na cobrança a outros órgãos. É o caso, explica Samira, da Polícia Técnico Científica, que deve ser alvo de mobilização por parte das organizações. 

    “Esperamos que haja um trabalho no sentido de buscar a legalidade nessas operações. O que queremos é interromper essas ações, mas enquanto elas existiram, que pelo menos se deem dentro da legalidade”, comenta Samira. 

    Operação Escudo/Verão

    Nesta segunda (26), o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, cobrou o governo Tarcísio sobre as ações da polícia na região. Segundo a Folha de São Paulo, o ofício cita legislações internacionais e decisões judiciais para questionar aspectos como o uso de câmeras corporais e a apuração dos crimes. 

    A Polícia Militar tem intensificado a atuação na Baixada Santista desde 2 de fevereiro, com a morte Samuel Wesley Cosmo. Na ocasião, já estava em andamento na região uma Operação Escudo

    No ano passado, após a morte do soldado também da Rota Patrick Bastos Reis, 30 anos, foi deflagrada uma Operação Escudo na qual 28 pessoas morreram em 40 dias de ação policial na região. 

    Neste ano, apesar de ter anunciado o reforço no policiamento com o nome de Escudo, o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, mudou de discurso e passou a dizer que as mortes e ações atuais estariam no âmbito da Operação Verão — que acontece tradicionalmente entre dezembro e fevereiro no litoral paulista. Contudo, em coletiva de imprensa, Derrite admitiu que o modus operandi é o mesmo nas duas operações.

    A confusão em torno do nome da operação tem causado dificuldades até mesmo para o controle das ações. Um dos promotores que integra um grupo criado pelo MPSP para investigar as mortes destacou que é difícil delimitar a abrangência de cada uma das operações em andamento e que isso atrapalha a apuração.

    O que dizem as autoridades 

    Ponte questionou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) sobre a continuidade da operação, a confusão no nome da ação, sobre a quantidade de policiais presentes na Baixada e sobre o uso de câmeras corporais. 

    Em nota, a SSP-SP respondeu que a operação em curso é a terceira fase da Operação Verão, iniciada após a morte de Wesley Cosmo. Nesta etapa 400 policiais de unidades como Batalhão de Ações Especiais de Polícia (Baep) do ABC Paulista, de Guarulhos e da Região Metropolitana da capital, além das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e do Comando de Operações Especiais (COE), atuam na região. 

    Veja nota na íntegra

    A Operação Verão teve início no dia 18 de dezembro de 2023 e sua primeira fase terminou no dia 5 de fevereiro, dando início à segunda fase, voltada para garantir a segurança de moradores e turistas. Após a morte do soldado Wesley Cosmo, foi deflagrada, no dia 7 de fevereiro, a terceira fase da ação, que permanece em andamento com o objetivo de asfixiar o crime organizado na Baixada Santista. Nesta etapa, a região conta com o reforço de 400 policiais militares de outras unidades, como o Batalhão de Ações Especiais de Polícia (Baep) do ABC Paulista, de Guarulhos e da Região Metropolitana da capital, além das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e do Comando de Operações Especiais (COE).

    Desde o início da operação, 789 criminosos foram presos, incluindo 297 procurados pela Justiça, e 548,7 quilos drogas retiradas das ruas. Além disso, 86 armas ilegais, incluindo fuzis de uso restrito, foram recolhidos. Até o momento, 33 pessoas morreram em confronto com a polícia, entre elas o líder de uma facção criminosa envolvida com o tráfico internacional de drogas, lavagem de dinheiro, tribunal do crime e atentado contra agentes públicos. Todos os casos de mortes em confronto são rigorosamente investigados pela Polícia Civil e Militar, com acompanhamento do Ministério Público e Poder Judiciário. Além disso, as corregedorias das polícias estão à disposição para formalizar e apurar toda e qualquer denúncia contra agentes públicos, reafirmando o compromisso com a legalidade, os direitos humanos e a transparência.

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