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    Apesar de queda de homicídios, aumenta número de mulheres assassinadas com e sem arma de fogo no Brasil

    14 de novembro de 2022 às 09:11

    Taxas de homicídios de mulheres causadas por pessoas armadas seguem mais altas especialmente nas regiões Norte e Nordeste, onde são 60% maiores que taxa nacional; metade das mulheres assassinadas no Brasil em 2020 foi vítima de arma de fogo

    Apesar da queda geral dos homicídios no país, a partir de 2017, as taxas de homicídios de mulheres brasileiras aumentaram 2% em 2020 e 5% em se tratando apenas daqueles cometidos com armas de fogo. Nas regiões Norte e Nordeste, os índices são 60% superiores à taxa nacional. Só no Nordeste, o homicídio de mulheres  aumentou 20,7% em comparação com 2020, refletindo a ligeira alta da média nacional naquele ano.

    A arma de fogo é o instrumento mais utilizado nos assassinatos de mulheres no Brasil: metade dos homicídios femininos entre 2012 e 2020 envolveram este artefato. Em 2020, o padrão permaneceu: para cada duas mulheres assassinadas no Brasil, uma foi morta por arma de fogo, resultando em 1.920 mulheres vítimas fatais de violência armada neste ano, um aumento de 5,6% em comparação com 2019.

    Nesta Semana Nacional de Luta contra a Violência à Mulher, o Instituto Sou da Paz lança pelo segundo ano consecutivo a pesquisa “O Papel da Arma de Fogo na Violência contra a mulher” no qual se debruçou sobre dados da vitimização feminina produzidos pelos sistemas de informações da Saúde , do Datasus, de 2012 a 2020.

    Mulheres negras são as mais vitimadas

    O estudo também revela que 7 em cada 10 mulheres assassinadas por arma de fogo no Brasil são negras, em um padrão que historicamente atinge de modo desproporcional essas mulheres no país. Contabilizando todas as mortes, segundo os diversos instrumentos de agressão utilizados, 53% dos assassinatos de mulheres negras envolveram armas de fogo em comparação com 44% entre as mulheres não negras.

    “Essa desigualdade na distribuição da violência que afeta de forma desproporcionalmente as mulheres negras é bastante grave no nosso país. Isso mostra que há uma população já tradicionalmente afetada pela desigualdade racial e pela falta de acesso a direitos e que também é mais vitimada pela violência armada”, avalia Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz.

    Local da ocorrência

    Outro dado impactante é o local da ocorrência dessas mortes, com o homicídio dentro de casa se mantendo alto e sendo as mulheres negras as mais vulneráveis à violência fora de casa. O estudo revela que 27% das mulheres assassinadas com arma de fogo, em 2020, morreram dentro de casa, a maior proporção desde 2012. Já os homicídios de mulheres negras ocorrem sobretudo na rua, local que respondeu por 45% dos casos em 2020. A casa segue em segundo lugar, respondendo por ¼ dessas mortes.

    As mulheres negras foram 2,3 vezes mais vitimadas com armas de fogo fora de casa (rua e outros ambientes públicos ou não domésticos) do que dentro de casa, enquanto para as mulheres não negras essa diferença é de 1,5 vezes. Ou seja, as mulheres negras são mais afetadas pela violência armada fora do contexto domiciliar, enquanto para as mulheres não negras o risco é similar nos dois ambientes. De todo modo, nota-se que as desigualdades raciais são reiteradas com taxas de violência armada mais altas para as vítimas negras em ambos os ambientes, em comparação às não negras.

    Perfil do agressor

    Em 2020, a cada quatro mulheres vítimas de violência (não letal) com arma de fogo, uma foi agredida por seu parceiro ou ex-parceiro. Nos últimos três anos, essa proporção apresentou tendência de alta, sobretudo a partir de 2019. Quando a violência armada é cometida por parceiros ou ex-parceiros, a chance de ocorrer em ambiente doméstico é elevada, em torno de 78% em 2020. Esse risco dentro de casa tem aumentado nos últimos anos, sobretudo a partir de 2019.

    Violência de repetição

    O estudo revela que o nível de violência repetida contra as mulheres é impressionante, com taxas chegando a 31% entre as vítimas de violência por arma de fogo admitidas nos serviços de saúde em 2020. Ou seja, quase ⅓ das mulheres vítimas de violência armada relataram ter sofrido episódios anteriores de violência.

    Chama atenção o fato de a violência de repetição envolvendo arma de fogo contra mulheres apresentar aumento mais expressivo a partir de 2018, justamente no período em que a representatividade dos casos ocorridos em domicílio também registra avanço. A violência de repetição compõe a dinâmica da violência contra a mulher e ocorre principalmente dentro de casa, onde 72% dos casos de violência armada associados à violência de repetição ocorreram.  

    Para além dos casos fatais, a arma de fogo está associada a diversos tipos de violência contra a mulher – como a física, a psicológica e a sexual -, e nos últimos três anos (desde 2018) a residência se tornou o principal local onde as mulheres sofrem agressões com arma de fogo (não fatais).

    Recomendações

    “Esses dados evidenciam os riscos que a flexibilização do controle de armas promovida pela atual gestão federal representa para as mulheres. No cenário atual de retrocessos, é fundamental dar visibilidade à presença da arma de fogo como fator de risco da violência doméstica e familiar e do aprofundamento das desigualdades de gênero”, diz Carolina Ricardo.

    A Lei 13.880/2019, incorporada à Lei Maria da Penha, prevê a apreensão de arma de fogo sob posse de agressor em casos de violência doméstica. Ela determina que, quando feito o registro de ocorrência de violência pela vítima, a autoridade policial consulte sobre a posse de armas pelo agressor e, em caso positivo, faça um pedido a um juiz para que essa arma seja apreendida.

    “Os dados da pesquisa mostram uma realidade em que esta lei precisa ser urgentemente aplicada para que ocorra menos violência de repetição e menos casos em que ocorrências de violência doméstica relatadas às autoridades se tornem feminicídios”, avalia.

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