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    NOTÍCIAS

    O Globo | Em 2019, Brasil registrou cinco armas por hora para pessoas físicas

    27 de dezembro de 2019 às 04:12

    Polícia Federal concedeu 44 mil autorizações de posse para ‘cidadãos comuns’ entre janeiro e novembro deste ano

    Juliana Castro e Marlen Couto

    Leia o texto original publicado no jornal O Globo.

    A flexibilização da posse de armas no Brasil foi promessa de campanha de Bolsonaro Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo
    A flexibilização da posse de armas no Brasil foi promessa de campanha de Bolsonaro Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo

    RIO – Sob o governo de Jair Bolsonaro, o Brasil bateu recorde de novas armas de fogo registradas em um só ano: foram 44.181 entre janeiro e novembro de 2019, alta de 24% em relação a todo o ano passado. É o maior número de autorizações para posse — isto é, para ter uma arma em casa — concedidas pela Polícia Federal desde 2010, segundo estatísticas inéditas obtidas pelo GLOBO com base na Lei de Acesso à Informação (LAI). O levantamento diz respeito apenas a registros para pessoas físicas, excluindo, por exemplo, aquisições de órgãos públicos e empresas de segurança e também dos CACs (colecionadores, atiradores e caçadores), cujo registro é feito pelo Exército.

    Mesmo sem os dados referentes a dezembro, o país vendeu cinco armas por hora a cidadãos comuns em 2019— maior média do que em todos os outros períodos analisados. Ano a ano, os registros de armas vêm aumentando. Em 2018, esse número era de 35.758, o maior até então — um aumento de 8% em relação ao ano anterior. A média era de quatro armamentos vendidos por hora.

    Em 2019, os maiores crescimentos percentuais de aquisições de armas em relação ao ano anterior ocorreram em Tocantins (645%), Mato Grosso do Sul (241%) e Mato Grosso (219%). Os números deste ano são três vezes maiores do que os de 2010, quando foram catalogados 12 mil novos armamentos.

    Facilitar o acesso da população a revólveres e pistolas foi uma promessa de campanha do presidente. Desde que assumiu, Bolsonaro editou oito decretos sobre porte e posse de armas. Quatro foram revogados após serem contestados por áreas técnicas do Congresso e pelo Ministério Público Federal, que os consideraram inconstitucionais.

    Autorizações para porte

    Pesquisadores ressaltam que um dos principais riscos do aumento de armas nas mãos de cidadãos comuns é o roubo dos equipamentos, que acabam usados por criminosos.

    — Os impactos são graves. A gente tem um consenso nas pesquisas de que a arma legal, a tal da arma do cidadão que compra para se defender, é uma arma que migra para o crime. Não é verdade que vai ficar guardada em casa, ela vai ser roubada. Quando fazemos rastreamento de armas usadas no crime, até cerca de 40% delas têm essa origem. É a arma que o seu João comprou e foi roubada — diz Isabel Figueiredo, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

    Houve também aumento no número de porte de armas — a autorização para andar armado —, sob a justificativa do uso para defesa pessoal, em relação aos anos anteriores. Na comparação com 2018, o crescimento foi de 4% (de 2.961 para 3.090), também sem considerar dados de dezembro deste ano. Os maiores aumentos percentuais ocorreram em Paraíba (246%), Maranhão (200%) e Sergipe (156%).

    Para Bruno Langeani, do Instituto Sou da Paz, o fato de Bolsonaro não ter conseguido facilitar por decreto regras para o porte de armas — o presidente recuou da ampliação para diversas categorias profissionais e decidiu enviar ao Congresso um projeto de lei que contempla o tema — fez com que o número de autorizações para andar armado não subisse ainda mais. Por outro lado, Langeani destaca que houve alta expressiva de armas para posse, mesmo com a dificuldade de se entender que regra está valendo, em meio às idas e vindas dos decretos presidenciais.

    — Bolsonaro não conseguiu mudar na canetada o porte, mas a venda de armas cresceu. Antes a regra (para posse) era conhecida, vigorou por 15 anos. Com Bolsonaro, tivemos três diferentes, em janeiro, maio e outra em junho. Só em agosto o Exército regulou os calibres permitidos para o cidadão comum. Se mesmo com a confusão toda para saber que regra está valendo ou não, houve crescimento expressivo, imagina quando isso estiver estabilizado — explica.

    O pesquisador ressalta outra mudança importante feita pelo governo. O registro de posse passou a valer por dez anos e não mais por cinco anos.

    — É uma outra flexibilização que é perigosa. Você só checa a aptidão para ter uma arma dez anos depois. Todas essas pessoas só vão renovar e precisar fazer os testes de novo em 2029. Além disso, há cinco ações pendentes de julgamento no Supremo, que pode derrubar as regras que estão valendo. A gente não sabe como ficará a questão para quem já conseguiu a posse de arma esse ano. Fica uma insegurança jurídica — diz Langeani.

    O governo também quadruplicou potência das armas de uso permitido a cidadãos comuns, desde que tenham calibre permito pelo Exército. Retirou ainda a necessidade de apresentação de atestado de antecedentes criminais na renovação, o que entra em conflito com decretos anteriores, e facilitou a posse de arma particular para militares e policiais, que ficaram dispensados de apresentar requisitos como atestado de aptidão psicológica.

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