Reportagem publicada no jornal O Estado de S.Paulo. Clique para ler texto original
Fernanda Boldrin, O Estado de S.Paulo
Após um ato contra o governo Jair Bolsonaro e autointitulado “pró-democracia” ter terminado em confronto entre manifestantes e apoiadores do presidente e também com a Polícia Militar no último domingo, 31, o Instituto Sou da Paz enviou nesta quarta-feira, 3, uma carta ao governo de São Paulo, na qual alerta sobre “tratamento desigual pelas forças de ordens a grupamentos políticos divergentes” e cobra “fiel observância” da lei, sobretudo em relação à atuação das polícias durante manifestações.
“Ao Estado de São Paulo e suas polícias, não resta outra alternativa a não ser garantir o fiel cumprimento do texto constitucional e assim assegurar a proteção de todas e todos que queiram se manifestar e protestar, independentemente de sua orientação política ou Ideológica”, diz o texto, que também repudia atos violentos de qualquer natureza.
O documento, assinado por Carolina Ricardo, foi enviado ao governador de São Paulo, João Doria (PSDB), ao secretário estadual de Segurança Pública, general João Camilo Pires de Campos, e ao Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público estadual, Mário Luiz Sarrubbo.
Diretora executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina avalia que as imagens disponíveis até o momento indicam diferença na atuação da polícia em relação aos grupos que se manifestavam no domingo. “As imagens mostram que eclodiu mais violência em relação ao grupo pró-democracia”, afirma ela, que defende transparência sobre os procedimentos adotados: “se houve uma ação técnica que justificou essa atuação que pareceu diferenciada, que isso venha a público e seja explicitado.”
No próprio domingo, a atuação da polícia foi alvo de críticas por ter sido direcionada somente a um dos lados do protesto. Do outro lado da Paulista, em frente à sede da Federação da Indústria do Estado de São Paulo (Fiesp), manifestantes pró-Bolsonaro foram cercados pela tropa regular da PM e continuaram normalmente o ato que conduziam.
Carolina reitera que o trabalho da polícia nesse tipo de contexto “não é simples”, mas diz que a orientação da tropa deve ser a de garantir um desfecho pacífico. Em sua visão, o contexto exige que a corporação tenha uma leitura política aguçada para conseguir executar papel de mediação. “A tropa precisa estar mais preparada, com comandantes com mais experiência, com sangue frio, com capacidade de diálogo”, afirma.
A carta enviada pelo Instituto Sou da Paz ao governo coloca ainda que “todo e qualquer ato, especialmente os adotados pela polícia, que infira tratamento desigual a cidadãos a partir de seu posicionamento político deve ser investigado e repudiado firmemente, nos termos da lei.” Mas o texto pondera que, “ainda que se aponte problemas graves, a Polícia Militar do Estado de São Paulo apresenta níveis de profissionalismo e de respeito à disciplina e à hierarquia superiores a muitas outras Polícias da federação”.
Procurada, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo afirmou, por meio de nota enviada na quinta-feita, 4, que “está atenta às diferentes manifestações de grupos ideológicos distintos e tem atuado, juntamente com as polícias, para proteger as pessoas e garantir o direito à livre manifestação.”
Novos atos já estão sendo chamados para o fim de semana por grupos ligados a torcidas de futebol, agora engrossados pela Frente Povo sem Medo, organização que reúne movimentos sociais, centrais sindicais e partidos de esquerda. Em São Paulo, as manifestações estão agendadas para o início da tarde de domingo na Avenida Paulista.
A secretaria de Segurança Pública disse ainda que estava em contato com o Ministério Público para a organização e o planejamento das ações de policiamento dos eventos e afirmou que os organizadores dos protestos haviam sido convidados para uma reunião com representantes do Poder Público nesta sexta-feira, 5.
A reunião, no entanto, que tentava chegar a um acordo entre os apoiadores e os opositores do presidente para definir detalhes da realização dos atos, como dia e horário, não deu certo. Segundo o secretário da Segurança Pública, João Campos, outra reunião será realizada ainda na tarde desta sexta. O governo estadual proibiu atos rivais (contra e a favor de Bolsonaro) simultâneos na capital.