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    “Minha neta chora de saudades do pai, mas não pode visitá-lo”

    25 de março de 2014 às 03:33

    A revista vexatória – procedimento pelo qual passam os visitantes de presos em que são obrigados a ficar nus, realizar agachamentos e ter sua genitália inspecionada – deixa marcas profundas em todas as pessoas que são obrigadas a se submeter a ela.

    Além de ser uma profunda violação da dignidade humana, a revista vexatória não impede que drogas e celulares entrem nos presídios.

    Na entrevista abaixo*, Ana Cristina Fonseca (nome fictício), 55 anos, conta um pouco sobre as dificuldades que enfrenta para continuar próxima de seu filho, que cumpre pena em um município a cerca de 500 km de sua residência, e também comenta a situação de abandono em que ficam os presos que não recebem a visita de suas famílias. Leia a seguir os principais trechos da entrevista que Ana Cristina concedeu à Rede Justiça Criminal, grupo de instituições que pressionam o Senado para proibir este procedimento nos presídios:

    Rede Justiça Criminal: Por que você visita seu filho preso?

    Ana Cristina: Por que eu visito meu filho? Eu não sei, acho que é coisa de mãe. Principalmente agora, nesse exato momento em que ele foi preso. Para mim foi injusto.

    Rede: A senhora acha importante visitar o seu filho?

    Ana: Acho! É muito importante o apoio da família. É por isso que eu vou e fico muito triste em ver meninos que a família nem procura. Tem família que diz que eles já aprontaram muitas vezes e acaba decidindo “dessa vez eu não vou”. E fica lá… Meu filho não, meu filho já é o contrário. Aprontou uma vez, mas nunca deixei ele de lado, nunca. A família inteira continua apoiando, mas não no que ele fez, e sim dando apoio moral. Sabe, meu filho fala assim: mãe, se eu não tivesse apoio da família, não sei o que seria de mim. Então é para ele acreditar que quando sair, terá um mundo melhor para ele.

    Rede: A senhora vê alguma diferença entre esses rapazes cujas famílias já não vão mais visitar e os que, como seu filho, recebem visita?

    Ana: Tem. Uma coisa que eu acho diferente, que a gente vê nos olhos deles: a tristeza. Porque mãe tem coração para todos e eu vou observando tudo. Eu observo muito os meninos que a família não vai visitar. E tem alguns deles, que eu não sei se eu devo falar, que em vez de pensar “vou sair daqui, eu vou melhorar, vou viver com dignidade”, eles vão entrar no fundão mesmo, na criminalidade mesmo. Em um minuto que você conversa ali com eles, já observa tudo. Eles falam assim: “quando eu sair, vou mudar, vou trabalhar, vou estudar.” Mas tem os outros que falam “quando eu sair, todos vão me pagar, sabe, na mesma moeda”.

    Rede: Quando a senhora vai visitá-lo, como é a revista?

    Ana: Nossa! Nem me fale. Para chegar até o filho da gente é um Deus nos acuda. Eu tiro roupa, tiro xuxinha de cabelo, tiro tudo o que tiver. Aí a agente manda agachar três vezes. Aí agacha. Aí faz força, tem que fazer força ainda para ver se cai alguma coisa, né. Aí vira de costas, abre a boca, revista ouvido, cabelo, e o quê mais? A sola do pé e as sandálias também. Até aqui na axila eles olham. São vários processos.

    Rede: A senhora conhece casos de pessoas que desistiram de visitar seus familiares presos por causa da revista?

    Ana: Eu presenciei uma coisa que me deixou indignada. Uma senhora de idade que tinha problema na coluna. Esse processo de abaixar, subir e descer, essa senhora saiu chorando de lá, sabia? Porque não conseguiu. E ela só poderia entrar se fizesse aquele mesmo processo que a gente faz. A gente tem força para subir e descer. Sabe o que é você subir e descer, subir e descer? Uma pessoa que tem problema na coluna, que já é de idade, não consegue fazer. Até a gente, de vez em quando, tem dificuldade. Rede: E a sua neta? A senhora a leva para ver o pai no dia de visita?

    Ana: Nem pensar!

    Rede: Ela não sente muita falta do pai preso?

    Ana: A Pati reclama muito. Ela chora o tempo todo para ir ver o pai, mas não dá, a revista é terrível.

    Rede: A senhora já viu outras crianças terem que passar por isso?

    Ana: Eu vi um menino de 13 anos que queria porque queria ir. Mas quando o carcereiro falou assim “Desce as calças. Se não tirar as calças, não descer a cueca, a gente vai deduzir que você está levando alguma coisa para o seu pai aí dentro”. Aí não deu outra, esse menino começou a chorar, dizendo que nunca mais ia voltar lá. A mesma coisa vai acontecer com a minha neta. Então, é por isso que não levo.

    *Entrevista extraída da 6ª edição do boletim da Rede Justiça Criminal. Clique aqui para ler o informativo completo.

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