Projeto do Deputado Peninha Mendonça (PMDB-SC) deve ser votado ainda em dezembro
No mês em que foram lançados os dados do 8º Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, dando conta que 70% dos mais de 50 mil homicídios do país foram cometidos com arma de fogo, a bancada da bala tenta revogar o Estatuto do Desarmamento (PL 3722/2012) para facilitar o acesso de civis a andarem armados nas ruas. Os deputados financiados pela indústria estão se mobilizando para derrubar a lei, uma das mais importantes para combater a violência do país.
O autor do projeto, o deputado Peninha Mendonça (PMDB-SC), conseguiu apoio da bancada financiada pela Indústria de Armas para compor uma comissão especial. A manobra permite que, após a aprovação na comissão, o projeto seja levado ao plenário. A expectativa é que a comissão vote o projeto no dia 10 de dezembro.
“As evidências de que a intenção da Comissão é aprovar o projeto sem debate no apagar das luzes desta legislatura fica evidente no cancelamento das seis audiências públicas que seriam realizadas pelo país e a substituição por apenas uma, que será realizada no dia 26 de novembro em Brasília/DF”, diz Ivan Marques, diretor executivo do Instituto Sou da Paz, que complementa, “vale destacar que a bancada de financiados pela indústria de armas conseguiu ocupar 10 das 19 vagas da Comissão, incluindo os cargos estratégicos de Presidência e Vice Presidência, garantindo um apoio confortável”.
O Sou da Paz, em conjunto com organizações da sociedade civil, pesquisadores e autoridades da segurança pública no país, protocolou hoje uma carta aberta ao Presidente da Câmara dos Deputados e ao presidente da Comissão Especial pedindo a rejeição do projeto.
A carta é assinada por representantes de diversas organizações e especialistas de peso no país, dentre as quais estão o Instituto Igarapé, Viva Rio, Conectas Direitos Humanos, Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESEC), Instituto de Defensores de Direitos Humanos (DDH), André Garcia (Secretário de Segurança e Defesa Social) e Álvaro Fajardo (Secretário de Ações Estratégicas), ambos do Espírito Santo, Luiz Eduardo Soares (ex-secretário Nacional de Segurança Pública), Renato Sergio de Lima (vice presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública), além de diversos pesquisadores e associados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Clique aqui e veja a carta dos apoiadores.
Estatuto do Desarmamento
O Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003) trouxe diversos avanços para o controle de armas no país, restringindo o porte de armas de civis, estabelecendo requisitos técnicos para a compra de armas por cidadãos e nacionalizando o banco de dados de armas do país para facilitar a fiscalização e a investigação de crimes relacionados a armas.
A mobilização para sua aprovação situou o controle de armas e desarmamento no topo da agenda nacional. Não por acaso, nos anos subsequentes à aprovação da Lei (2004 e 2005), houve a entrega voluntária de mais de 500 mil armas em todo Brasil e redução de óbitos por arma de fogo em 12 %, segundo relatório do Ministério da Saúde publicado em 2006.
A proibição ao porte de arma é o principal eixo da Lei e demonstra uma clara indicação de que as escolhas do país priorizam ações que promovam uma segurança pública construída coletivamente, refutando o argumento fácil e demagogo das soluções individuais. “O argumento de que mais cidadãos armados ajudam a reduzir crimes é falacioso. Mais cidadãos armados não trazem nenhum impacto para a redução de crimes patrimoniais, e ainda contribuem para um aumento dos homicídios”, finaliza o diretor.
Dados da CPI do Tráfico de Armas produzidos pela própria Câmara dos deputados em 2006 e pesquisa recente do Instituto Sou da Paz divulgada em dezembro de 2013, na qual foi analisada a totalidade das armas apreendidas em São Paulo, comprovam que 78% das armas ilegais apreendidas pela polícia foram produzidas no Brasil. Além disso, 64% destas armas ilegais apreendidas com criminosos haviam sido fabricadas antes de 2003, o que significa que sofremos hoje com armas que entraram em circulação legalmente num momento em que a legislação era mais frágil.