Organizações destacam principais mudanças em novas regras sobre porte e posse de armas de fogo editadas pelo Governo Federal
Por conta da quantidade de modificações em decretos e portarias era esperada alguma atualização desta instrução normativa, que operacionaliza o tema de armas na Polícia Federal.
Após mais de 20 atos normativos publicados pelo Governo Federal e que alteram a política nacional de controle de armas e munições, temos um quadro de complexidade regulamentar que leva a uma situação de caos normativo, o que diminui a eficiência da legislação e dificulta o cumprimento e fiscalização das normas pelos cidadãos e pelos órgãos de controle.
Quanto à IN nº 174-DG/PF, de 20 de agosto de 2020, há uma evolução no sentido de modernizar e informatizar os pedidos, o que é positivo e ajuda especialmente a tramitar pedidos onde não há postos da Polícia Federal, mas é inevitável destacar que, enquanto há um esforço ágil e muito eficiente da máquina federal para facilitar a compra, medidas que ajudam o controle e atuação das Polícias no monitoramento e rastreamento de armas de fogo foram revogadas pelo governo, o que é grave. Avanços na marcação e rastreamento revogados em abril, por ordem de presidente, até o momento não foram substituídos. Na mesma, linha a integração dos sistemas de armas da PF e Exército (respectivamente SINARM e SIGMA), que eram para ser integrados desde 2004, seguem sem conexão, o que dificulta o rastreamento de armas no país.
São alguns destaques das novas regras:
Porte: O presidente Bolsonaro tentou, ainda como deputado federal, aprovar projetos de lei para legalizar o porte civil em iniciativas que não chegaram nem a ser aprovados nas comissões. Posteriormente, pelo Decreto 9785, de maio de 2019, tentou conceder portes a diversas categorias (incluindo jornalistas e caminhoneiros), e, após sofrer derrota no Senado e sob ameaça de ver o decreto declarado inconstitucional no Supremo Tribunal Federal, voltou atrás.
Agora, pela Instrução Normativa 174-DG/PF tenta novamente flexibilizar requisitos para o porte civil, que pelo Estatuto do Desarmamento deveria ser exceção.
Na IN, há ampla margem de interpretação para definir o que é de atividade profissional de risco, brecha para não apresentar elementos concretos de justificativa de necessidade em caso de fatos públicos e notórios, o que contradiz a necessidade de que a justificativa seja concreta, específica e atual.
A norma traz uma presunção de veracidade de toda a documentação apresentada pelo cidadão o que agora obriga a Polícia Federal a provar que os fatos não são verdadeiros para poder negar, possibilidade que é inviável frente ao prazo de 30 dias para apreciação após o pedido (inovação também trazida no governo. Bolsonaro pelo Decreto 9.845, de junho de 2019).
Guia de Trânsito: liberação de deslocamentos com armas para treinamento ou conserto saiu de 2 para 12 vezes ao ano (1 por mês). Ainda que a instrução obrigue que a arma seja transportada sem munição para alguns tipos de armas como pistolas, isso pode ser feito rapidamente abrindo mais uma brecha para circulação de civis armados.
Limite de armas: de 2 armas por pessoa, agora passou para 4, sem a possibilidade de uma análise de necessidade da Polícia Federal (adequando aos decretos de junho/19). Além da dispensa da avaliação de necessidade, abre brecha para que esse limite de 4 armas também seja expandido sem necessidade justificada em casos de herança, abrindo a possibilidade de acumulação de arsenais injustificados.
Flexibilização da consulta a antecedentes: Antes era exigida não só certidões negativas de antecedentes criminais, mas também certidão de não estar atualmente respondendo a inquéritos policiais ou processos, o que agora foi substituído por mera declaração.
Análise para concessão do registro mais frágil: Antes o processamento previa uma consulta sobre o quantitativo de armas registradas no nome do solicitante (tanto no SINARM, quanto no SIGMA para verificar as quantidades, mas também a existência de ocorrências, anotações, roubo, furtos,etc), esta etapa foi eliminada sem qualquer justificativa.
Benefício ao proprietário criminoso ou negligente: O proprietário que tem a arma apreendida ou arrecadada por registro vencido é premiado. Ele pode escolher entre regularizar em 60 dias, ganhar indenização pela entrega (o contribuinte paga pelo seu descumprimento da lei) ou pode ainda vender a arma a terceiros.
Porte de policiais aposentados menos controlado: Reavaliação (psicológica e técnica) antes obrigatória a cada 5 anos, passa a ser 10 anos. Considerando que já estamos falando de pessoas com mais idade, a expansão pode gerar problemas com aposentados armados nas ruas sem reunir as condições motoras ou psicológicas necessárias.
Porte fora de serviço para guardas municipais pequenas: autoriza guardas de cidades de 50 a 500 mil habitantes a portarem armas fora de serviço (mesmo contrariamente à disposição da lei).