Análises embasaram portarias do Exército revogadas a pedido de Bolsonaro
Por Francisco Leali (leia matéria completa publicada pelo O Globo)
O governo decidiu manter em sigilo os documentos e estudos produzidos pelo Exército para elaborar as portarias com regras sobre controle de produção de armas e munições revogadas por determinação de Jair Bolsonaro. Desde abril, quando o presidente deu esta ordem, o Exército se negava a divulgar os estudos. Pedidos de acesso feitos com base na Lei de Acesso à Informação (LAI) foram rejeitados, e o caso foi parar na Controladoria-Geral da União (CGU), instância recursal prevista na legislação. Na última semana, a CGU manteve o sigilo dos documentos, apesar de pareceres técnicos em contrário. O órgão também já havia autorizado sigilo de pareceres jurídicos relacionados a vetos do presidente da República a projetos aprovados no Congresso.
Na decisão, a Ouvidoria-Geral da CGU acatou os argumentos do Exército, que alegou que a divulgação dos documentos poderia trazer “riscos à sociedade”. Segundo a Força, os estudos “necessitam de reanálise para que se façam os devidos ajustes”. A CGU entendeu, porém, que o sigilo deve durar apenas até que o Exército aprove novas regras para o controle de armas e munições. As portarias revogadas criavam o Sistema Nacional de Rastreamento de Produtos Controlados (SisNaR) e tratavam do rastreamento dos produtos controlados pelo Exército, como armas e munições.
“Entendo que devem ser acatados os argumentos apresentados pelo Comando do Exército, especialmente porque se trata de uma restrição de acesso temporária uma vez que, após a edição dos novos atos, o que está previsto para ocorrer em novembro de 2020, todos os documentos dos processos identificados poderão ser disponibilizados, inclusive os que fundamentaram a edição das portarias revogadas. Porém, em um contexto completo, em que todas as falhas foram analisadas, corrigidas e consignadas nos respectivos processos, permitindo aos cidadãos uma compreensão exata do que ocorreu”, diz o parecer.
Os pedidos de acesso haviam sido feitos pelo GLOBO e pelo Instituto Sou da Paz. Nos dois casos, a decisão contrariou pareceres de diferentes auditores. No do GLOBO, uma auditora escreveu que, segundo a LAI, os arquivos solicitados são o que a lei chama de “documentos preparatórios”, que são públicos após o órgão tomar a decisão à qual se relacionam. No do Sou da Paz, um auditor teve a mesma posição.
— É muito grave a negativa apesar de a lei ser explícita ao dizer que documentos preparatórios são públicos após a edição do ato administrativo — disse o coordenador do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani. — As portarias tratam de temas que dizem respeito à segurança pública e interessam a toda a sociedade.
Em 17 de abril, Bolsonaro avisou pelo Twitter: “Atiradores e colecionadores, determinei a revogação das portarias Colog (Comando Logístico) 46, 60 e 61 de março de 2020 que tratam do rastreamento, identificação e marcação de armas, munições de demais produtos controlados por não se adequarem às minhas diretrizes definidas em decretos”. Procurada, a CGU não se manifestou.
Após a publicação da reportagem o Exército informou, por meio de nota que, após a publicação de nova portaria em novembro,os estudos que forem usados para embasar sua edição serão divulgados.