Decreto que amplia concessão e diminui exigência para registros é regulamentado
Por Rayssa Motta
A Polícia Federal formalizou anteontem a autorização que dobra o limite para aquisição de armas de fogo no Brasil. Além de regulamentar decreto presidencial publicado em maio do ano passado, que já previa a concessão de registro de até quatro armas por pessoa, a nova norma amplia para dez anos a validade da inscrição dos armamentos, diminui a exigência de documentos e elimina a necessidade de se observar intervalos entre os pedidos.
A instrução autoriza ainda o treinamento mensal, no lugar do semestral, a quem tiver arma de fogo, “com a possibilidade de utilização do armamento pessoal”. A corporação sustenta que o objetivo da medida é “desburocratizar” a posse e o porte de armas no País.
A medida foi anunciada anteontem pelo presidente Jair Bolsonaro durante uma transmissão ao vivo nas redes sociais. A instrução derruba norma anterior que, segundo o presidente, “dificultava” a aquisição de armamentos e foi revogada a pedido de um apoiador. Ele também afirmou que o tempo para deferimento do registro pela PF diminuiu em um terço após a saída de Sérgio Moro do comando do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
‘Caos normativo’. Uma das promessas de campanha de Bolsonaro, a tentativa de flexibilização do porte de armas acompanha o presidente desde que ele assumiu o cargo. Além de reuniões com lobistas e empresários do setor, e de cobranças dirigidas aos ministros, o governo já tentou triplicar o limite para a compra de munições e revogou três portarias que aprimoravam o rastreamento e a marcação das balas e armamentos.
“Após mais de 20 atos normativos publicados pelo governo federal e que alteram a política nacional de controle de armas e munições, temos um quadro de complexidade regulamentar que leva a uma situação de caos normativo, o que diminui a eficiência da legislação e dificulta o cumprimento e fiscalização das normas pelos cidadãos e pelos órgãos de controle”, reagiu em nota o Instituto Sou da Paz.
Para os porta-vozes da entidade, Bruno Langeani e Felipe Angelini, o governo vem facilitando o acesso às armas ao mesmo tempo que reduz ferramentas de controle de munições. “Enquanto há um esforço ágil e muito eficiente da máquina federal para facilitar a compra, medidas que ajudam o controle e atuação das polícias no monitoramento e rastreamento de armas de fogo foram revogadas pelo governo, o que é grave.”
‘Risco’. De acordo com o sociólogo Ignacio Cano, professor da Uerj e especialista em segurança pública, nos últimos tempos aumentou o número de cidadãos armados. “Não há dúvida de que o governo está tendo sucesso nessa empreitada”, disse.
“A proposta do governo sempre foi armar a população, a princípio com a suposta intenção de que as pessoas se protejam contra os criminosos. (Mas) estamos cansados de saber que as armas em circulação na verdade colocam o cidadão em um risco maior, além de diminuir o preço das armas no mercado negro”, afirmou o sociólogo.
“Porém, após a reunião ministerial, ficou claro que, além desta suposta intenção, há um propósito político para que as pessoas possam resistir a ordens de outros governos, e não ao governo dele, obviamente. É armar a população para dificultar o estado de direito, a aplicação da lei e permitir que pessoas resistam à aplicação da lei”, disse Cano.