Medida da gestão Bolsonaro é tomada enquanto país conta milhares de mortos durante pandemia
O Instituto Sou da Paz vem a público manifestar seu repúdio e indignação em relação à portaria interministerial nº 1634/2020, publicada pelo presidente Jair Bolsonaro nesta quinta-feira, 23 de abril, cuja única função é facilitar de forma irresponsável e descontrolada a compra de munições por cidadãos. Para armas de calibre permitido, as cotas anuais passaram de 50 munições para 600 por arma. Com isso, se somados calibre de tiro esportivo e caça um único cidadão pode comprar mais de 6 mil munições por ano.
O Instituto avalia que, em um país com aproximadamente 50 mil mortes cometidas com armas de fogo por ano e que atravessa uma pandemia que já tirou a vida de quase 3 mil brasileiros, a medida é um ato completamente descolado da realidade, das evidências científicas e também das prioridades da maioria da população que se posiciona contrária à ampliação do acesso a armas. O Governo Federal deveria neste momento concentrar todos os seus esforços na luta contra a pandemia do coronavírus e não agradar a indústria de munições e grupos minoritários que advogam pelo total descontrole da política de armas.
Em quase um ano e meio de gestão o presidente já afrouxou as regras de compra e de porte de armas de fogo, ampliou em quatro vezes a potência das armas que podem ser adquiridas por civis e agora aumenta pela segunda vez e de forma irresponsável a cota anual de compra de munições por arma. Ainda na semana passada, mandou cassar as únicas três portarias do Exército que em sua gestão trouxeram inovações importantes para o controle de armas e munições. Assim como nas outras medidas, a portaria publicada hoje é errática e sem embasamento, pois uma mudança no limite de munições já havia sido feita há menos de três meses e, assim como na portaria anterior, não houve justificativa para fundamentar o motivo e a necessidade da alteração.
Nos últimos anos, o país viu uma explosão no número de pessoas que compraram armas. Em 2019, os civis com registros de posse de armas atingiram aproximadamente 380 mil pessoas. Se todos adquirirem a nova cota máxima, o número de munições que podem ser disparadas em um ano chega a 227 milhões que, numa ironia trágica, é quantidade suficiente para reservar um projétil para cada cidadão brasileiro vivo.
Em um momento em que os principais líderes mundiais se dedicam a salvar vidas e reduzir o impacto da pandemia em seus países, é um disparate constatar que o presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e o da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, dediquem seu tempo a ampliar o número de munições em circulação no país, o que também contribui para abastecer milícias e o crime organizado.
Além das armas de fogo historicamente serem instrumento da maioria dos homicídios no país, atual circunstância excepcional de isolamento social já se constata o aumento de homicídios e da violência doméstica em vários estados. Inserir mais pólvora no estresse natural gerado em período de confinamento e crise econômica só irá gerar mais sofrimento, sobrecarga no sistema de saúde pública e mortes.
Infelizmente, iniciativas no Congresso e no STF para conter outros ataques ao devido controle de armas e munições não avançaram, frustrando a adoção de freios e contrapesos que poderiam frear essa marcha da insensatez. O presidente demonstra que entre trazer benefícios coletivos para a segurança pública e beneficiar segmentos específicos da sociedade, como atiradores e a indústria de armas, irá optar sempre pelos últimos. O Instituto Sou da Paz espera que as instituições públicas reajam a esta iniciativa.