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    NOTÍCIAS

    Agressores alcoolizados são responsáveis por 35% da violência armada não letal contra mulheres ocorrida em casa em 2022, revela pesquisa

    8 de março de 2024 às 06:02

    Pessoas próximas são responsáveis por 43% das agressões não letais com arma de fogo; uma em cada duas mulheres assassinadas no Brasil é vítima deste artefato

    A soma do machismo, armas em casa e abuso de álcool é um fator de risco para a vida das mulheres brasileiras. É o que revela a terceira edição da pesquisa O Papel da Arma de Fogo na Violência Contra a Mulher, lançada pelo Instituto Sou da Paz com dados do Ministério da Saúde do ano de 2022. No período analisado, 25% das notificações de violência armada não letal indicam suspeita de que o agressor consumiu álcool. Essa taxa sobe para 35% nos casos ocorridos dentro de casa e o cenário pode ser ainda pior já que 45% das notificações não apresentam essa informação. Em relação à violência letal, o país vive uma redução nas agressões fatais desde 2017, época em que a proporção desses casos era de 54%. Mesmo assim, 50% dos assassinatos de mulheres no Brasil foram realizados com armas de fogo em 2022. Destas mortes, 27% ocorreram dentro de casa. 

    Acesse o infográfico e a pesquisa completa: https://lp.soudapaz.org/mulheres

    As diferenças de gênero também são colocadas na forma em que homens e mulheres morrem. Mesmo que os homens façam parte do grupo mais vitimizado por arma de fogo, os cenários e circunstâncias das violações físicas das mulheres chamam a atenção para as dinâmicas de poder entre os gêneros e reforçam a violência contra a mulher como um forte problema social brasileiro. Enquanto o afrouxamento da política de controle de armas, vigente entre 2019 e 2022 no governo Bolsonaro, permitiu o aumento desses artefatos nas casas tendo como principais argumentos a falácia de que supririam lacunas da segurança pública ou a primazia da autonomia individual, esse debate deixa de considerar que 39% dos homicídios de mulheres em casa foram cometidos com emprego de arma de fogo em 2022

    O perfil dos agressores revela outra realidade triste, pois, entre os casos de violência não letal com armas de fogo, 43% foram efetuadas por pessoas que têm proximidade com a vítima, sejam parceiros, amigos, conhecidos ou familiares, com destaque para os parceiros íntimos: companheiros ou ex-companheiros responderam por 28% das agressões não fatais com emprego de arma de fogo registradas em 2022, revela a pesquisa. Este cenário tem piorado com o aumento da proporção de violência praticada por pessoas no ciclo de relações íntimas das mulheres nos últimos quatros anos. 

    Conhecer o perfil dos agressores das mulheres é uma forma de subsidiar políticas públicas mais efetivas. No entanto, atualmente esse perfil só é detalhado no sistema de saúde nos casos de agressões não letais, por meio do Sistema de Informação de Agravos de Notificação. O perfil nos casos de feminicídios, por outro lado, precisaria ser construído a partir dos dados das Secretarias de Segurança Pública responsáveis por investigar a autoria e circunstâncias dos homicídios. Porém, o país sofre com a escassez de informações sobre

    o esclarecimento de homicídios, como revelado pela pesquisa Onde Mora a Impunidade, do Instituto Sou da Paz. 

    Violência armada não letal contra mulheres cometida por parceiros íntimos entre 2012 e 2022

    Fonte: Instituto Sou da Paz 

    Quem são as mulheres vítimas de homicídios por armas de fogo 

    Entre 2012 e 2022, em média, uma mulher foi assassinada a cada 4 horas no Brasil. A média de homicídios femininos registrados no país é de 4,4 mil ao ano. Armas de fogo foram utilizadas na metade dos casos, o que significa dizer que uma em cada duas mulheres assassinadas no Brasil é vítima deste armamento. Em 2022, 60% das vítimas femininas tinham entre 20 e 39 anos de idade. 

    As diferenças raciais, contudo, apresentam-se no perfil e nas dinâmicas dos assassinatos. As mulheres negras são as que figuram no topo do sombrio cenário de agressões fatais por armas de fogo, correspondendo a 68,3% dos casos, seguidas por brancas (29,5%), indígenas (0,5%) e amarelas (0,3%), o quesito racial foi ignorado em 1,4% das ocorrências. 

    Circunstâncias das agressões contra mulheres 

    Diferente do que ocorre com os homens, as casas das mulheres seguem sendo um local de risco, pois 27% dos homicídios são praticados nesses espaços, enquanto é o local de assassinato de homens em 12% dos casos. Esse número se modifica quando observado a partir do recorte de raça, 34% das mortes por arma de fogo das mulheres não negras ocorrem em suas residências. Já as vias públicas são um fator de risco maior para as mulheres negras, 45% das vitimizações ocorrem nesses espaços. 

    Nas violências armadas não letais, 43% das mulheres vitimadas sofreram a agressão armada dentro de casa e 30%, na rua. Em um terço das violências armadas não letais, a

    vítima já possuia registros anteriores de atendimento por violência, o que mostra a importância de reforçar o apoio estatal para que as mulheres vitimadas consigam romper ciclos de violência com mais antecedência, encontrando canais adequados de denúncia, acessando medidas protetivas e recebendo assistência social. 

    Em 2022, observou-se a menor diferença proporcional entre o assassinato de mulheres negras e não negras desde 2012. Entre as mulheres negras vitimadas, 51% foram mortas com arma de fogo, enquanto entre as mulheres não negras, essa proporção foi de 47%. Esse dado indica que a proporção de mortes por agressão armada volta a crescer apenas entre as mulheres não negras, o que pode estar ligado ao fato da facilitação de acesso a armas nas casas da população, já que elas são mortas nas residências com mais frequência do que as mulheres negras. 

    Porcentagem de agressão armada em relação ao total de homicídios de mulheres segundo raça/cor entre 2012 e 2022 

    Fonte: Instituto Sou da Paz 

    Para Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, o relatório mostra a interface brutal entre a disponibilidade e circulação de armas de fogo e a violência contra a mulher. “Após a retomada de uma política responsável de controle de armas pela nova gestão federal, estamos em um cenário mais propício para as discussões sobre o fortalecimento de medidas de prevenção e enfrentamento à violência armada, mas a arma segue sendo um fator de risco para a violência praticada contra mulheres, em especial contra mulheres negras”, diz Carolina. “A preocupação aumenta por saber que homens brasileiros estão mais armados que nunca após anos de aumento do acesso a armas. Assim, é preciso fortalecer o controle da circulação dessas armas de fogo e fortalecer medidas de prevenção a agressões que podem resultar em morte”, diz. 

    Recomendações

    Entre as iniciativas que buscam trazer mais segurança para as mulheres recomendadas pelo Instituto Sou da Paz estão a implementação da Lei Federal 13.880/2019, que alterou a Lei Maria da Penha. No intuito de evitar que a violência doméstica escale para um homicídio, a mudança determina que durante a denúncia de agressão a(o) delegada(o) pergunte se o agressor tem acesso a armas de fogo e, em caso positivo, que a arma de fogo seja apreendida cautelarmente mediante decisão judicial. 

    Outra medida foi a implementação do Formulário Nacional de Avaliação de Risco para a prevenção e o enfrentamento de crimes e demais atos praticados no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, utilizado tanto na segurança pública quanto na área da saúde. Além de traçar os cenários de riscos das agressões, o questionário, que deve ser aplicado quando do registro da ocorrência de violência, traz perguntas sobre violência com armas de fogo e sobre porte de arma do agressor. 

    “É preciso também garantir a ampliação das Delegacia de Atendimento à Mulher, com plantões em horários de maior vitimização, assim como ter mais mulheres nas corporações policiais para prestar esse atendimento especializado e para ocupar espaços de gestão, trazendo pontos de vista mais diversificados no âmbito das escolhas estratégicas pelo enfrentamento às violências contra a mulher”, recomenda Carolina. 

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