Política pública integrando segurança com cultura, o TerPaz investe em ações de inclusão e transformação social em comunidades e bairros periféricos da capital paraense
Reportagem publicada pela Ponte Jornalismo (clique para acessar o texto original) feita por Cassio Miranda, ganhador do programa de microbolsas de reportagem “Comunidades Vivas”, do Instituto sou da Paz em parceria com a Ponte
Reduzir a criminalidade no Brasil ainda é um dos grandes desafios na agenda do poder público. O paraense Roberto Reis, 30 anos, é líder comunitário, morador do município de Marituba, região metropolitana de Belém do Pará, e conta com orgulho que hoje é possível sair nas ruas e encontrar com vizinhos e andar se sentindo mais seguro, mesmo que no bairro onde mora era sinônimo de medo e insegurança e já foi considerado umas das 10 cidades mais violentas do país. A realidade do cenário atual segundo o morador é por conta do projeto Territórios pela Paz (TerPaz), criado em 2019, pelo governo do estado do Pará, que uniu segurança pública e cidadania nos bairros da periferia do estado como uma ferramenta no combate da violência em áreas vulneráveis da região metropolitana de Belém.
Por meio de ações articuladas do governo, secretarias e parceiros, a política pública TerPaz se apresenta como modelo de boas práticas da gestão em segurança pública visando a transformação social para contribuir na redução da criminalidade no estado.
As ações do TerPaz incluir diversos serviços de cidadania (atenção à saúde, cursos profissionalizantes, esporte, lazer e entretenimento) com intuito de frear a dinâmica da violência urbana e pacificar o território, através do policiamento especializado e de aproximação entre os moradores e as forças de segurança, para prevenir conflitos e a criminalidade no local.
Desde sua criação em 2019, os Territórios pela Paz, e suas atividades desenvolvidas estão presentes em sete bairros periféricos considerados áreas críticas da criminalidade na Grande Belém, são eles: Guamá, Jurunas, Terra Firme, Benguí, Cabanagem (todos em Belém), Icuí (em Ananindeua) e Nova União, no município de Marituba. Além desses bairros, o programa tem atuado em Parauapebas e Canaã dos Carajás, cidades no sudeste do estado
TerPaz Marituba
Atualmente nove territórios no Pará já receberam o modelo de política pública do TerPaz. O município de Marituba foi a terceira localidade a ser contemplada pelas ações, e as primeiras atividades ali ocorreram nos bairros São Francisco e Nova União, atendendo várias famílias que vivem em situação de vulnerabilidade social. Depois da implantação nesses pontos o TerPaz se ampliou para todo o município.
Segundo o portal Agência Pará, desde a implementação da política pública do Territórios pela Paz, em Marituba, em 2019, foram realizados mais de 29 mil atendimentos à população em locais como escolas públicas, centro comunitários e delegacias do bairro.
Serviços como assistência à saúde, assistência social, orientação jurídica, capacitação profissional, entrega de lâmpadas econômicas, doações de cadeiras de rodas para portadores de necessidades especiais atenderam as necessidades dos moradores.
Vidas transformadas
Uma das ações conjuntas do projeto TerPaz Marituba foi a realização de oficinas de educomunicação desenvolvidas com estudantes da escola Dom Calábria, com foco no ensino das múltiplas linguagens da comunicação comunitária para juventude.
A estudante Eyshilla Frazão, 21 anos, participou da oficina de educomunicação e ressaltou que a experiência mudou sua visão de mundo até chegar na universidade.
“Estava terminando o ensino médio e o TerPaz veio como uma oportunidade, uma nova perspectiva de vida, novos objetivos, sonhos, muitos jovens tiveram a chance de aprender mais, conquistar um trabalho, isso gerou uma mudança na nossa realidade, fazendo com que muitos jovens buscassem ter uma vida melhor”, conta.
Hoje, já formada em pedagogia, a estudante ressaltou que as ações dos territórios pela paz nos bairros ajudaram a reduzir a criminalidade. “Os índices de crimes diminuíram muito, trouxe mais segurança, novos projetos e isso ajudou porque agora vejo ambientes sociais e culturais que trazem mais esperança pra nós moradores.”
O jovem Wesley Travassos, 17 anos, é morador do bairro Nova União, em Marituba, comenta que os projetos desenvolvidos pelo TerPaz em sua cidade propiciaram mais esperança e oportunidades para os jovens da comunidade.
“As atividades do TerPaz me fizeram bem, me trouxe esperança. Dentre as várias atividades, escolhi praticar esporte, sempre quis e gosto de judô. Pude fazer novos amigos, sem contar que podemos brincar, se divertir na rua sem aquele medo de antes. A violência aqui era demais, hoje, temos paz e me sinto mais seguro, o TerPaz trouxe esperança para nós da periferia, afinal também temos sonhos.”
Para Roberto Reis, líder comunitário e morador há 30 anos do bairro Nova União, as ações do TerPaz mudaram completamente a vida das pessoas, principalmente, na sensação de segurança e redução da violência no local.
“Antes tínhamos muitos assaltos, crimes violentos e os confrontos policiais eram frequentes fazendo com que os comerciantes fechassem as portas mais cedo, por conta da violência. A gestão de segurança pública desse programa é boa, porque consigo ver um policiamento de pacificação no bairro, onde os policiais interagem com a comunidade, conversam com a população sobre violência[…] Claro que não é tudo 100%, mas em relação à segurança pública melhorou muito, pois hoje temos asfalto, saneamento, isso também é segurança pública para a comunidade.”
“Pessoas nas frentes de suas casas conversando de forma tranquila, coisa que anos atrás não se via por aqui, por conta do medo da insegurança, dos roubos e assaltos frequentes”, conclui o líder comunitário.
A autônoma Francisca da Silva, 33 anos, também vivencia essa sensação de paz e segurança. Ela contou que o projeto trouxe muitos benefícios aos moradores.
“Moro há cinco anos aqui neste bairro e o TePpaz trouxe muitos benefícios, como a segurança pública e a presença da polícia é bem mais frequente; também os serviços como consultas, esporte, lazer, e a própria cidadania de poder tirar um documento, como a carteira de identidade, por exemplo, isso é valorizar as pessoas, o bairro.”
Segurança e Cidadania
Para Igor Normando, secretário de estado à frente da Secretaria Estratégica de Articulação da Cidadania (Seac), órgão responsável pela articulação das políticas de segurança e ações sociais dos Territórios pela Paz, o projeto tem desempenhado uma estratégia eficaz no combate à criminalidade e na valorização de uma cultura de paz.
“A política pública Territórios pela Paz tem se mostrado uma ferramenta eficaz no combate à criminalidade nos territórios atendidos. Ela promove a integração entre diversos setores da sociedade, incluindo governo, organizações da sociedade civil e população, para enfrentar as causas subjacentes da criminalidade, criando um ambiente mais seguro e inclusivo.”
Questionado sobre os desafios que ainda precisam ser feitos para ampliar a cobertura do TerPaz em Marituba, o secretário ressaltou que os principais avanços incluem o fortalecimento da infraestrutura local para fomentar o desenvolvimento da região e as políticas sociais gerenciadas pelo projeto.
“Os principais desafios do poder público para avançar ainda mais com as políticas sociais em Marituba incluem o fortalecimento da infraestrutura local, a expansão de programas educacionais e de capacitação, a garantia de acesso igualitário a serviços de saúde de qualidade e o contínuo engajamento da comunidade para a sustentabilidade dessas políticas. O TerPaz, tendo as UsiPaz como ponto principal, aponta para a criação e perpetuação de ambientes seguros que garantam oportunidades para todos”, finaliza o secretário.
As Usinas da Paz, também chamadas de UsiPaz, citada na fala do secretário, são complexos comunitários e multifuncionais que estão integrados ao programa estadual Territórios Pela Paz (TerPaz). São estruturas físicas construídas numa área de 10 mil metros quadrados com objetivo de garantir a atuação do Estado na prevenção à violência com incentivo à inclusão social, abrangendo serviços nas áreas de assistência, esporte/lazer e cultura.
O complexo Antônia Corrêa, UsiPaz Marituba, inaugurado em 19 março de 2022, está localizado na rua Bom Sossego, s/n, no bairro Nova União, em Marituba, Região Metropolitana de Belém. De acordo com dados da SEAC, cerca de 145 mil atendimentos diretos foram realizados para a população do município durante um ano de funcionamento.
Queda da violência no território
O município de Marituba, que já foi considerado uma das 10 cidades brasileiras mais violentas do país, teve redução de 62% para 32% a taxa de criminalidade sobre os Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs) a cada 100 mil habitantes,no ano de 2019, segundo a secretaria de segurança pública do estado do Pará (Segup).
De acordo com dados da Segup, Marituba obteve queda nos índices de crimes violentos Letais intencionais (CVLIs), que inclui os crimes de homicídios, latrocínio e lesão corporal seguida de morte. Os assassinatos na região registraram 46 mortes violentas em 2019, em comparação a 2018, com registro de 117 ocorrências no número de mortes violentas no município desta natureza.
Em 2020, foram contabilizados 42 mortes, caindo para 36 em 2021, depois 27 em 2022 e até a última atualização 20 mortes violentas foram registrados no balanço dos dados da gestão de segurança pública do Pará, em relação aos crimes violentos intencionais.
Os índices levantados correspondem a uma comparação entre o 1 semestre do ano de 2018 (antes da Política Pública TerPaz) ao semestre de junho de 2019 a 2020, após a implementação do programa Território pela Paz, na região de Marituba.
Letalidade policial
Em relação à atuação das forças policiais, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, apontou que o Pará teve um aumento na morte de agentes e civis durante abordagens policiais em todo o estado.
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, no Pará, em 2021, 12 agentes foram mortos dentro e fora de serviço. Já em 2022, 17 perderam suas vidas em confrontos com criminosos. Em relação à letalidade policial de civis houve um salto de 548 mortes em 2021 para 621 em 2022, taxa correspondente por cada 100 mil habitantes.
Ainda, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, foi divulgado o balanço das cidades mais violentas em todo país para morar, segundo população com taxa acima de 100 mil habitantes no ano de 2022. O município de Marituba apareceu em 50º posição com taxa de 41,6% em relação à taxa de Mortes Violentas Intencionais computados no ano de 2022.
De acordo com nota divulgada à imprensa, a segup, vinculada ao governo do estado, informou que realiza constantemente ações de pacificação nos territórios com ações de cidadania e segurança pública por meio da política pública do terpaz.
“A segurança pública no município de Marituba hoje, encontra-se com uma nova roupagem, fruto de um trabalho realizado pelo TerPaz com ajuda da secretária de segurança pública onde as pacificações de territórios aconteceram num momento em que o município era o 10° mais violento do Brasil. O índice de criminalidade no município caiu bastante no ranking nacional. Hoje os trabalhos voltam para as ações de cidadania em bairros, escolas e praças”, destaca Patrícia Abdon, gestora da Usina da Paz Antônia Corrêa, em Marituba.
Ítalo Acatauassu, diretor das Usinas da Paz, ressaltou que a política do TerPaz tem dado resultados significativos no atendimento da população em todo o estado, gerando melhores números na redução da violência e pacificação dos territórios.
“Até o momento, foram realizados inúmeros beneficiamentos desde a implantação do TerPaz Marituba e, com a chegada da Usina da Paz, já foram realizados mais de 200 mil beneficiamentos diretos em favor da população, neste primeiro ano de instalação do Complexo Multifuncional”, segundo o diretor.
Onde fica Marituba?
O município de Marituba faz parte da região metropolitana de Belém e foi fundado em 1994, com a Lei Estadual nº 5.857, de 22 de setembro de 1994. Este ano a cidade fez 29 anos de emancipação política e sua área geográfica compreende 20 bairros. Situado às margens da BR-316, o município fica distante cerca de 21 km da capital paraense.
Segundo o site oficial da prefeitura de Marituba, em 2010, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH-M) atingiu 0,676, considerado médio, ocupando o 5º lugar no ranking estadual.
Segundo dados gerados pelo censo de 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cidade possui cerca de 110.115 mil habitantes, já o rendimento do salário médio mensal dos trabalhadores formais, até 2021, era de 2,1 salários mínimos.
Segundo o portal do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, do governo do Brasil, até agosto de 2023, 39.604 famílias em Marituba foram inseridas no Cadastro Único (Cadúnico), e 29 mil dessas famílias ganhavam até meio salário mínimo e recebiam algum benefício social do governo federal, como o Bolsa Família. A economia do município gira em torno de órgãos da administração municipal, indústria, agropecuária e de serviços.
