Sou da Paz ingressou com pedido no STF para participar como “amicus curiae” em duas ações; organização denuncia ataque à Constituição e projeto autoritário
Desde que ocupa a Presidência da República, diversas foram a iniciativas de Jair Bolsonaro para flexibilizar a política de controle e rastreamento de armas e munições. Depois de uma mesma regulamentação da lei de controle de armas ter vigorado de 2004 a 2018, o país assistiu o presidente editar sete decretos apenas em 2019. Como últimos atos, revogou medidas que melhoravam marcação, controle e rastreamento de armas e munições.
Para piorar publicou, via portaria interministerial, mencionada na polêmica reunião entre ministros, novas ampliações nas quantidades de munições que podem ser compradas por cidadãos, militares e policiais, sem trazer nenhuma contrapartida em termos de obrigações ou rastreabilidade destas munições, que poderão ser facilmente desviadas sem nenhuma responsabilização.
Por conta do claro prejuízo à política de controle de armas e à segurança, várias iniciativas do MPF abriram investigação para cobrar esclarecimentos do Governo Federal, que está agora sob suspeita de interferir em atos de exclusividade do Exército. Também já há uma série de Projetos de Decreto Legislativo em tramitação no Congresso Nacional propondo a invalidação das medidas do presidente.
Deputados e senadores já apresentaram 73 Projetos de Decreto Legislativo (PDL) com o objetivo de sustar os efeitos de decretos sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e também das portarias sobre munições.
Só sobre os decretos que flexibilizam o acesso a armas são 59 PDLs, sendo 46 desses originados na Câmara e 13 no Senado, enquanto que sobre as portarias de munições são 14, sendo 12 na Câmara e 2 no Senado até o momento.
A tramitação de um PDL segue o mesmo rito de tramitação de um projeto de lei. Eles são distribuídos às comissões, têm que ser aprovados nas duas casas legislativas e não há possibilidade de veto presidencial, justamente por terem como objetivo a sustação de atos do Executivo. Um desses PDLs apoiado pelo Instituto, que sustava o decreto 9.785 de maio/2019 foi aprovado no Senado Federal em junho daquele ano e ia à Câmara dos Deputados mas uma manobra do presidente Jair Bolsonaro fez o projeto perder o seu objeto, quando ele revogou o decreto que estava sendo questionado no legislativo – também prestes a ser julgado no STF pela sua anulação – para então publicar outro com teor bastante similar.
Sou da Paz atua também na frente judicial para barrar ilegalidades no projeto armamentista
Outra frente que pode obrigar o presidente a voltar atrás em seu projeto armamentista são as ações na Justiça. Até o momento existem sete ações no Supremo e ao menos quatro na Justiça Federal, sendo que várias delas têm pedidos de liminares, que uma vez analisadas podem gerar efeitos imediatos como a anulação de decretos e portarias editadas.
O Instituto Sou da Paz já foi admitido como “amicus curiae” (amigo da corte, em latim), cujo papel é auxiliar o tribunal, oferecendo esclarecimentos, informações e dados técnicos sobre questões essenciais ao processo, em duas ações e recentemente protocolou um pedido junto ao Supremo Tribunal Federal para que ingresse nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs), que são ações propostas quando há a suspeita de que um dispositivo constitucional foi violado ou descumprido, à 681 (impetrada pelo PDT) e nº 683 (pelo PSOL) como “amicus curiae”.
“A portaria COLOG 62 e a Portaria Interministerial GM-MD no 1.634/2020 constituem um projeto pessoal e autocrático de Bolsonaro que põe em risco a democracia brasileira e os direitos fundamentais à vida e à segurança, atentando contra a Constituição Federal”, comenta Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz. “Num momento em que o país já enfrenta seu maior desafio econômico e social em décadas, o governo procura impedir melhorias nos sistemas de registro e rastreamento de armas e munições e aumenta irracionalmente o acesso a munições pela população civil, munições que serão impossíveis de serem rastreadas caso sejam desviadas, como acontece rotineiramente”, diz.
Para o Sou da Paz, a portaria COLOG 62 e a Portaria Interministerial GM-MD no 1.634/2020 devem ser anuladas porque apresentam os seguintes vícios:
• Violação ao devido processo administrativo e aos requisitos dos atos administrativos
• Violação ao princípio democrático – promoção do armamento civil como ameaça à democracia
• Violação ao princípio republicano
• Violação ao princípio da separação entre os poderes
• Violação dos direitos fundamentais à vida e à segurança
• Impacto desproporcional sobre os direitos dos moradores de áreas submetidas ao controle de facções e milícias
• Violação ao princípio da proibição do retrocesso social
O pedido do Instituto Sou da Paz está sendo apreciado pelo STF que deve decidir em breve se admite a organização como “amicus curiae”.
Informações para a imprensa:
Izabelle Mundim – izabelle@soudapaz.org