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    MATÉRIAS

    Especial Polícias: como Chile, Argentina e Brasil pensam a segurança pública

    Reportagem publicada pelo Opera Mundi em 06 de outubro de 2012:

    Enquanto os candidatos à Prefeitura de São Paulo discutem a viabilidade de aumentar o contingente e o poder da Guarda Civil Metropolitana, outros problemas relacionados às forças de segurança pública afligem a sociedade paulista. Os guardas civis metropolitanos dividem o patrulhamento das ruas com a Polícia Militar, responsável pelo trabalho ostensivo no Estado de São Paulo.

    Essa instituição, que foi criada por decreto da Ditadura Militar em 1970, acumula desde aquela época denúncias de abusos contra a população. De 2005 até este mês, pelo menos 3206 pessoas foram mortas pela Polícia Militar, segundo dados da Secretaria de Segurança Publica do Estado de SP. Neste mesmo período, a ROTA, batalhão criado durante o regime militar, matou cerca de 500 pessoas.

    Movimentos sociais e organizações de direitos humanos atribuem a alta letalidade e a violência das ações da polícia militar ao seu vínculo com o período ditatorial e propõem que a estrutura do órgão seja desmilitarizada. O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas aderiu ao pedido no último mês de maio, quando recomendou ao governo brasileiro o combate dos grupos de extermínios presentes em suas forças de segurança pública (os chamados “esquadrões da morte”) e a extinção da Polícia Militar.

    O caso brasileiro não é único entre os países latino-americanos, marcados por regimes militares altamente repressivos na história recente e que ainda lutam pela consolidação dos direitos democráticos.

    Opera Mundi traz três matérias sobre diferentes modelos de policiamento e de segurança pública vigentes na América do Sul. De um lado, Aline Boueri e Luciana Taddeo revelam as experiências da população argentina ao lado de uma polícia totalmente desmilitarizada. De outro, Victor Farinelli revela a lógica de funcionamento dos Carabineros de Chile, instituição de cunho fortemente repressivo, que foi reativada durante a ditadura do general Augusto Pinochet. Por fim, Fillipe Mauro e Marina Mattar refletem acerca do caso brasileiro, dando voz a especialistas sobre a necessidade ou não de desmilitarizar a PM.

    No Chile, a corporação militar do país, os Carabineiros, foi criada em 1927 pela ditadura do general Carlos Ibáñezdel Campo (1927-1931) e reativada durante o regime de Augusto Pinochet (1973-1990), adquirindo caráter ainda mais repressivo. Neste período, foi criado o batalhão de Forças Especiais, com a determinação de atuar no “controle de multidões e manifestações, visando à manutenção da ordem pública”, segundo um instrutivo interno da instituição.

    Este grupo da polícia militar é responsável até hoje pela repressão de protestos e recebe a maior parte das denúncias contra violência policial no Chile. Somente nas marchas estudantis ocorridas entre junho de 2011 e o mesmo mês de 2012, foram registradas 3147 denuncias de abusos, torturas, nudez forçada e detenções injustificadas no INDH (Instituto Nacional de Direitos Humanos).

    Segundo o historiador Sergio Grez Toso, da Universidade do Chile, nos governos da Concertação (aliança de centro-esquerda que governou o país após a ditadura, entre 1990 e 2010) não houve mudanças estruturais na polícia militar. Somente em 2007, durante o governo da socialista Michelle Bachelet, foi estabelecido um curso de direitos humanos para oficiais de alta patente, o que foi mantido pelo atual presidente, Sebastián Piñera.

    Grande parte dos estudiosos e ativistas envolvidos com a questão da violência policial aponta que a desmilitarização pode ser a chave para solucionar este problema, entendido como uma herança maldita das ditaduras. Foi essa percepção que motivou os argentinos a desmilitarizarem suas polícias durante a redemocratização em 1992.

    Desde 1992, a Gendarmería e a Prefectura Naval – oriundas do Exército e da Marinha respectivamente – passaram a ser controladas por civis. Para Marcela Perelman, coordenadora da equipe de Políticas de Segurança e Violência Institucional do Centro de Estudos Legais e Sociais, este foi um importante marco para a democracia argentina.

    “Vale a pena recapitular que, na transição democrática da Argentina, quando se começou a discutir que lugar teriam as Forças Armadas e Policiais, um dos consensos foi a demarcação entre Segurança Interior e Defesa. A lei de Segurança Interior, de 1992, mostra que não deve haver atividade militar no interior do país, nem a identificação de inimigos internos”, explica Marcela.

    A ruptura com o período da Ditadura Militar é questionada por Marcelo Saín, doutor em Ciências Sociais, deputado pela província de Buenos Aires e especialista em segurança pública. Ele afirma que, apesar do aparente caráter civil da Polícia Federal Argentina, que atua principalmente na Capital Federal, e da Polícia da Província de Buenos Aires (La Bonaerense, como é conhecida), ambas as forças são fortemente militarizadas em sua estrutura e atuação.

    Para Georgina Arturi, da Coordenadoria Contra a Repressão Policial e Institucional (Correpi), o cotidiano dos moradores não foi alterado. “Todas são forças de segurança de um Estado que tem como política a repressão preventiva, voltada para os jovens de setores populares, e seletiva, voltada para militantes de organizações sociais”, afirma. “Desde 1983 até hoje, 66 pessoas foram assassinadas pelas forças de seguranaça durante protestos sociais. São mais de 3500 mortos pelo aparelho repressivo do Estado desde 1983. De que democracia estamos falando?”

    Muitos brasileiros têm a certeza de que as práticas da polícia militar devem mudar para o órgão se adequar ao regime democrático e aos direitos do cidadão. Milhares de pessoas assinaram um abaixo-assinado nas redes sociais pelo fim da Polícia Militar de São Paulo e movimentos como as Mães de Maio e a Rede 2 de Outubro, que lutam pela desmilitarização e pela justiça popular, se fortalecem cada vez mais.

    Consultado pela reportagem de Opera Mundi, André Vianna, especialista em segurança pública do CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha) e coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo, acredita que a desmilitarização não vai resolver o problema.

    É o que pensa Luciana Guimarães, diretora da ONG Sou da Paz. Para ela, não há sentido algum na desmilitarização das corporações já que esse processo não significa abolir seu trabalho ostensivo. “Mesmo com essa mudança, a formação e a agenda da polícia seria muito semelhante, pois não é mudando o nome que toda a corporação vai mudar” disse ela ao Opera Mundi.

    Para Luciana, é necessário que as instituições de controle e o treinamento da polícia militar sejam aperfeiçoados.  “Há necessidade de um processo de ajuste da doutrina (documentos que orientam a atuação), da educação (formação), do treinamento continuado (aos que estão já em atividade) e, sobretudo, no sistema de controle interno”, acrescenta André.

    No entanto, alguns estudiosos não concordam com essa posição e afirmam que a polícia, militar ou civil, continuará agindo com truculência e de forma abusiva nas periferias das grandes cidades. “A polícia é um instrumento de governo da conflictividade da política democrática e isso explica porque a política democrática na Argentina não é simpática a uma reforma policial. Porque a polícia serve para disciplinar os setores populares, para controlar politicamente a oposição, para regular mercados ilegais e o crime organizado”, argumenta Saín.

    Enquanto que o problema da violência policial e da alta letalidade das forças de segurança pública é claro e explícito em nossa sociedade, sua solução parece levantar muitas interrogações.

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